Napoleão Bonaparte: um imperador e sua relação com o vinho

“Na vitória você merece Champanhe; na derrota você precisa dele”. Esta frase, proferida por Napoleão Bonaparte, tornou-se um exemplo da polivalência do Champagne, que se mostra até hoje a bebida adequada para muitos momentos de nossa vida. E este paralelo traçado pelo general e imperador francês evidencia também que o vinho estava em uma posição de destaque em sua trajetória.

Napoleão não bebia somente para celebrar ou afogar as mágoas. Relatos indicam que ele consumia vinho regularmente, mesmo durante suas várias campanhas militares. Sua opção era misturar o seu vinho tinto favorito, que era servido a partir de garrafas rotuladas com a letra N que o fez famoso, com água. Sim, Napoleão já parecia seguir o conceito que álcool em excesso pode ser prejudicial, sobretudo quando ligado com trabalho.

Seus vinhos favoritos

Os historiadores parecem ter um consenso quando o assunto é definir quais os vinhos favoritos de Napoleão. Sua frase histórica certamente mostra que o Champagne era um deles. O imperador era conhecido por seu gosto refinado e tinha clara preferência por um produtor: Moët & Chandon. Por conta de sua preferência pela marca, a partir de 1801 ele recebia remessas personalizadas. E retribuiu realizando diversas visitas, ao longo dos anos, a esta Maison, sediada em Épernay.

Um outro vinho de sua preferência também merecer uma citação do imperador francês. “Nada faz o futuro parecer tão rosado como contemplá-lo através de uma taça de Chambertin”. Napoleão, mostrando seu bom gosto, deixava clara sua paixão pelos vinhos de Chambertin, já considerados na época dentre os melhores da França. Porém, para o espanto de muitos, preferia misturar estes Pinot Noirs elegantes e precisos com água. Certamente o futuro seria mais transparente…

Napoleão também foi um consumidor ávido do Vin de Constance, produzido na África do Sul e já na época considerado como um dos melhores vinhos doces do mundo. Em seus últimos cinco anos de vida, foi exilado pelos britânicos na remota Ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul. Neste período teria recebido mais de 300 galões deste vinho e reza a lenda que, em seu leito de morte, Napoleão recusou todas as outras comidas e bebidas oferecidas. Antes de morrer, teria pedido apenas uma única taça de Vin de Constance.

Sua maior contribuição

A maior contribuição de Napoleão ao mundo do vinho, porém, está longe de ser relacionada às suas preferências. Ao assumir o poder na França em 1799, como primeiro cônsul, o general colocou entre suas prioridades principais mudar a legislação francesa. Seguindo os preceitos da Revolução Francesa, deveria haver uma lei que valesse para todos.

Em 1800, ele nomeou uma comissão para ajudar a desenvolver um código de lei unificado, que se aplicaria a todos os franceses, sendo válido em todas as partes da França. Liderada por Jean-Jacques-Régis de Cambacérès, esta comissão se reuniu 87 vezes para discutir, desenhar e elaborar um novo código civil. O próprio Napoleão participou de 36 dessas reuniões para garantir que a comissão incluisse sua própria agenda e ideias. O resultado foi publicado em 21 de março de 1804. Nesse dia, a França recebeu oficialmente seu novo Código Civil, que mais tarde ficou conhecido como Código Napoleônico.

Lei das heranças muda os vinhedos para sempre

O terceiro livro do novo código, Dos Diferentes Modos de Aquisição de Bens, concentrou-se em negócios, contratos e herança. E foi através da mudança da lei de heranças que Napoleão deixou uma marca que é vista até hoje nos vinhedos franceses, sobretudo na Borgonha. Anteriormente, apenas o filho primogênito tinha direito a receber propriedades como herança. Isso garantia que as propriedades fossem mantidas de forma integral, sem divisões.

Mas isso mudou após o Código Napoleônico. Desde 1804, as heranças, inclusive de propriedades, deveriam ser divididas de forma igual entre os herdeiros, fossem eles homens ou mulheres. E a aprovação da nova legislação levou a uma divisão das propriedades, entre elas os vinhedos. Um exemplo é o Clos de Vougeot, um vinhedo Grand Cru na Borgonha, que tinha na Igreja o único dono antes da Revolução. Refletindo várias divisões, ele atualmente conta com mais de 80 proprietários para a mesma extensão de terra

Esta legislação afetou algumas regiões da França de forma mais intensa que outras (a impacto na Borgonha foi mais sentido, com Bordeaux na outra ponta, sendo pouco afetada). Porém, é inequívoco que o Código Napoleônico tenha sido um dos principais fatores na moldagem dos vinhedos franceses nos últimos dois séculos.

Homenagem póstuma

Existe mais uma associação de Napoleão com o vinho. Quem visita Fixin, no norte da Côte D’Or, pode ter a oportunidade de conhecer o Clos Napoleon. Este vinhedo murado, de quase dois hectares, era conhecido como Aux Cheuzots, até ter seu nome alterado, ainda no século XIX, por Claude Noisot. Ele, que era oficial do exército francês e acompanhou Napoleão em seu primeiro exílio, na Ilha de Elba, decidiu prestar homenagem ao seu imperador.

O vinhedo é, ironicamente, um monopole (vinhedo com apenas um dono, algo relativamente raro na Borgonha), atualmente controlado pela Domaine Pierre Gelin. É classificado como Premier Cru Fixin e dá origem a um vinho que pode ser encontrado também no Brasil. Para quem quiser provar ou homenagear o imperador francês, o vinho era vendido, em dezembro de 2021, na faixa de R$ 1.100 por garrafa.

Fontes: Liberty, Equality and Taxation: Wine in the French Revolution, Noelle Plack; Wine Spectator; Wine Enthusiast; The Mystery
of the Climats
; Napoleonic Code: The Civil Code of 1804

Imagem: Montagem a partir de imagens de Cristian Aular via Pixabay e alohamalakhov via Pixabay

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