Vinhedos com mais ou menos videiras: isso influencia a qualidade dos vinhos?

Um dos motivos por que o vinho se tornou tão popular na Antiguidade é a versatilidade das videiras. Estas plantas se adaptam facilmente e podem ser cultivadas em locais onde poucas outras espécies vegetais sobrevivem. Não faltam casos, ao redor do mundo, de vinhedos plantados em condições adversas. Alguns exemplos são os solos de cinza vulcânica de Santorini, os cascalhos do Bordeaux ou as colinas de ardósia do Mosel.

Esta incrível capacidade de adaptação e de extração de nutrientes de solos muito pobres já é conhecida há milênios e foi descrita pelo autor do Império Romano Columela, considerado um dos pais da viticultura. O escritor deixou claro, já em torno de 60 d.C., que essa habilidade da vinha, porém, pode ter consequências na qualidade do vinho.

Para obter bons vinhos, o autor, nascido em Cadiz (atual Andaluzia), afirmou que é necessário que as videiras não tenham acesso a água e nutrientes em demasia. As videiras, deste modo, devem “competir” pelos recursos, caso contrário os vinhos não teriam a intensidade e complexidade necessárias. Quantidade de videiras e qualidade do vinho podem andar de mãos dadas.

Densidade de vinhedos

Quase 2.000 anos depois, as práticas de vinhedo seguem, de forma geral, estes princípios. E um dos pontos principais é definir a densidade dos vinhedos, ou seja, quantas parreiras serão plantadas em uma determinada área. A atual convenção é contabilizar o número de plantas por hectare, informação que, inclusive, pode ser encontrada nas regras de praticamente todas as denominações de origem ao redor do mundo.

O raciocínio por trás disso é que a densidade seria um indicador de qualidade. Quanto maior a densidade, melhor a qualidade da uva. A lógica é a mesma usada pelos romanos, de que as videiras, quando plantadas próximas, têm que competir entre si por nutrientes e água, forçando-as a expandir sua rede de raízes, com consequente aumento na complexidade de seus frutos.

A densidade padrão para a viticultura europeia tradicional é de 10.000 videiras por hectare, o que significa um espaçamento de um metro entre as videiras. Este é o padrão adotado nas principais regiões francesas, como Bordeaux, Borgonha e Champagne, embora as regras de suas respectivas denominações de origem sejam mais flexíveis.

Definição de regras

Embora o “número mágico” de 10.000 plantas por hectare seja usado frequentemente, as regras das denominações de origem variam bastante. Em geral, elas determinam densidades mínimas, poucas vezes colocando um teto para o número de videiras. Ou seja, por conta disso, existem regiões (que são mais exceções do que regra) onde a densidade atinge até 20.000 ou 30.000 videiras por hectare.

Porém, a maioria dos vinhedos é cultivada com densidades menores. Na Borgonha, por exemplo, a densidade mínima para diversos vinhedos Premier Cru e Grand Cru fica na faixa de 9.000 videiras por hectare, que cai para 8.000 na Champagne e 7.000 em Margaux, no Bordeaux. Há regiões com densidades mínimas ainda menores, como o Chablis, na faixa de 5.500 videiras nas denominações Villages e Premier Cru.

Atenção ao terroir

No entanto, como quase tudo no mundo do vinho, não existe uma densidade que funcione bem para todos os vinhedos. Por exemplo, em locais com solos muito pobres ou com grande concentração de vinhas velhas, a densidade costuma ser muito menor. A justificativa é que existe um limite de quanto as videiras podem “sofrer” na busca por água e nutrientes. Videiras com déficit hídrico ou de nutrientes não conseguem gerar uvas de qualidade.

Em exemplo é denominação de origem Priorat, uma das mais conceituadas da Espanha. Seus solos de llicorella, uma espécie de ardósia, são muito pobres e, em suas áreas mais disputadas, plantados com grande concentração de vinhas velhas. Por conta disso, as regras da Priorat DOCa determinam uma densidade máxima de 9.000 videiras por hectare, com um mínimo de 2.500, que subiu para 3.000 para as videiras plantadas a partir de 2013.

Deste modo, não existe uma fórmula mágica para definir a densidade ideal de videiras, pois as condições do terroir podem variar de forma significativa, mesmo dentro de uma mesma denominação de origem. Nesta hora, vale a máxima de buscar confiar no produtor, que, quando de qualidade, escolherá as condições de vinhedo ideais para produzir os melhores vinhos ao seu alcance.

Fontes: Jancis Robinson; Priorat DOCa; Cahier Des Charges De L’appellation D’origine Contrôléee Chablis; A História do Vinho, Hugh Johnson

Imagem: PIRO4D via Pixabay

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