Vinhos com ou sem sulfitos: estudo na França aponta níveis ideais

O uso de sulfitos na elaboração de vinhos é um tema que vem gerando muita controvérsia nos últimos anos. De um lado, há aqueles que veem esta prática como absolutamente indispensável; de outro os que enxergam isso como uma intervenção desnecessária, que altera os aromas e sabores do vinho. Qual das partes envolvidas tem razão nesta discussão?

Buscando responder esta pergunta, o Institut Français de la Vigne et du Vin (IFV) resolver testar diversos cenários de diminuição do uso de sulfitos em diversas regiões francesas.  Neste experimento, os técnicos realizaram a vinificação usando três estratégias distintas: uso “normal” de SO2, queda de 50% em relação ao normal e uso mínimo, correspondendo a menos de 10 mg/L de sulfitos.

Entendendo os motivos

O uso dos sulfitos, ou dióxido de enxofre (SO2), tornou-se generalizado na enologia desde o final do século XVIII. Por conta de sua facilidade e baixo custo, esse aditivo rapidamente se estabeleceu como uma ferramenta universal para a produção de vinhos. Mais recentemente, porém, seu uso vem caindo. Por conta da evolução das regulamentações e práticas enológicas nos últimos vinte anos, foi registrada uma redução significativa dos níveis de sulfito nos vinhos oferecidos para consumo.

No entanto, reduzir ou mesmo eliminar os níveis de sulfito nos vinhos continua sendo uma grande preocupação para a indústria vinícola. Diante da crescente preocupação dos consumidores com aditivos e conservantes “sintéticos” usados em alimentos, os viticultores estão cada vez mais engajados na produção de vinhos com baixo teor de sulfito ou mesmo sem sulfitos adicionados. Isso tem levado, porém, a uma série de questões sobre o controle da oxidação e a prevenção de alterações microbianas nos vinhos.

Resultados gerais

O estudo foi realizado em diversas regiões e com variedades diferentes, com os resultados sendo reportados individualmente. De modo geral, a redução de 50% trouxe, na maioria das regiões vinícolas, melhores resultados. Destaque para ganhos em termos de sabores nos Chardonnay na Borgonha, Merlot em Bordeaux, Syrah no Vale do Rhone e também nos espumantes da Champagne.

Já a eliminação do uso de sulfitos trouxe resultados distintos. De forma geral, o resultado foi uma oxidação mais rápida dos vinhos (sobretudo para variedades com menor presença de taninos) e a criação de alguns compostos aromáticos incomuns. Para fazer frente a estes desafios, a conclusão é que são necessárias melhoras nos processos de armazenamento e distribuição dos vinhos.

Borgonha, Bordeaux e Rhône

Na Borgonha, a maioria dos vinhos tolerou a redução de 50% de SO2 muito bem. A qualidade de Chardonnay parece ter melhorado. “Os aromas frutados foram mais evidentes para os vinhos como metade de sulfitos, enquanto o uso de 100% pode induzir uma tendência de redução”, explicou Vincent Gerbaux, engenheiro microbiologista do IFV. Por outro lado, a ausência total de sulfitos levou a perfis oxidativos atípicos.

Em Bordeaux, os ensaios foram realizados com uvas Merlot saudáveis, colhidas na maturidade tecnológica e no início da maturação fenólica. A rota de 50% possibilitou a obtenção de níveis totais de SO2 ao final do envelhecimento de 30 mg/L. Tanto ela como a eliminação de sulfitos resultaram em uma queda de 10 a 15% nos polifenóis (vinhos de coloração menos intensa) e gerou vinhos jovens agradáveis, mas aromaticamente menos adequados para o envelhecimento. Por outro lado, não houve vinhos com níveis perceptíveis de acidez volátil nos dois cenários onde o SO2 foi reduzido.

No Vale do Rhône, os vinhos feitos a partir da Grenache se mostraram mais sensíveis à oxidação do que os de Syrah. A redução dos sulfitos em 50% continua sendo possível. “Dado o alto pH dos vinhos, ir além disso pode levar ao risco de perda de qualidade”, alerta Nicolas Richard, da InterRhône. Uma ação com uso de sulfitos é recomendada após a fermentação malolática para prevenir a ação de microrganismos, bactérias lácticas e Brettanomyces. Uma leve adição de sulfitos no momento do engarrafamento parece uma prática eficaz.

Champagne, vinhos do Sudoeste e rosés da Provence

Na Champagne, a eliminação total de sulfitos causou o aparecimento de um caráter oxidativo aleatório, que pareceu incompatível com o transporte dos mostos. Por outro lado, os testes realizados com Chardonnay, Pinot noir e Meunier ao longo de cinco safras, mostraram inícios de fermentação alcoólica mais rápidas e nenhuma latência para a meia dose de SO2. Os vinhos com 50% menos SO2 mostraram uma melhor expressão frutada do que os vinho base, até o disgorgement.

Em relação aos experimentos no Sudoeste da França, alguns vinhos brancos com um ciclo curto e consumo rápido, como Sauvignon Blanc, não toleraram bem a queda do SO2. “As diferenças são notáveis a nível sensorial. O vinho com dose normal de sulfitos se mostrou mais frutado, o vinho com 50% é menos frutado e aparecimento de notas de evolução. Por fim, as notas oxidativas dominaram os vinhos sem adição de sulfitos”, observou François Davaux, do IFV Sud-Ouest.

Nos vinhos rosé da Provença, a coloração mudou, com aqueles com menos sulfitos se mostrando proporcionalmente mais intensos, com reflexos alaranjados. Isso também depende da cepa usada, se Syrah ou Grenache. “Portanto, é mais ou menos fácil, dependendo da variedade de uva, se livrar dos sulfitos como pré-fermentativos, explica Matthias Bougreau, para o IFV e o Centre du Rosé.

Fontes: Les sulfites en œnologie; Vitisphere

Imagem: Elf-Moondance via Pixabay

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